
A Comissão de Saúde, Previdência e Assistência Social da Assembleia Legislativa
discutiu, em audiência pública nesta terça-feira (25), as dificuldades enfrentadas por
pacientes com doença falciforme em Mato Grosso. O encontro, presidido pelo deputado
Lúdio Cabral (PT), reuniu familiares, representantes do Ministério Público, Hemocentro e
Secretaria de Estado de Saúde.
A principal crítica apresentada foi o desconhecimento de profissionais de saúde sobre a
doença, o que resultaria em atendimentos inadequados e descumprimento de
protocolos. Regina Valadares, mãe de um jovem de 19 anos com anemia falciforme,
relatou que o despreparo de médicos e enfermeiros tem provocado complicações graves.
Ela afirmou que o filho sofreu um AVC em 2014 após um médico desconsiderar o
protocolo de tratamento durante uma crise de dor. Diagnosticado pelo teste do pezinho
aos 10 dias de vida, o jovem acumula mais de 50 internações.
Evillyn Costa, de 32 anos, também descreveu dificuldades no manejo da dor. Segundo
ela, é comum receber questionamentos e ser tratada como “viciada em morfina”, apesar
de nunca ter utilizado o medicamento fora do ambiente hospitalar. Ela lembrou ainda que
passou grande parte da infância internada e já enfrentou complicações provocadas por
erro em transfusão de sangue.
A vice-coordenadora da Associação de Pessoas com Doença Falciforme de Mato Grosso
(ASFAMT), Alvair Santana de Oliveira, avaliou que o cenário reflete o racismo institucional,
já que a doença atinge majoritariamente pessoas negras. Ela apontou ainda dificuldades
no atendimento do próprio Hemocentro, unidade de referência no estado. Segundo
Alvair, mudanças na regulação reduziram o acesso dos pacientes a retornos periódicos.
Após reuniões, a divisão de vagas destinadas ao Hemocentro passou de 30% para 50%,
mas ainda não atende à demanda.
O responsável técnico do Hemocentro, Wolney Taques, afirmou que o remanejamento das vagas deve reduzir o problema. A unidade atende cerca de 700 pacientes com doença
falciforme.
Outro ponto de preocupação é a distribuição da hidroxiureia, medicamento de uso
contínuo fornecido pela Farmácia de Alto Custo. Representantes relataram interrupções
no abastecimento e resistência de médicos em prescrevê-la por se tratar de um
quimioterápico. Pacientes também enfrentam dificuldades para acessar diferentes
especialidades médicas, já que a doença pode comprometer múltiplos órgãos.
Ao final da audiência, Lúdio Cabral listou encaminhamentos que serão monitorados pela
Comissão. Entre eles, a ampliação da cobertura do teste do pezinho, capacitação de
profissionais, reorganização da rede de atendimento e definição de uma unidade de
referência para intercorrências da doença falciforme. O parlamentar também defendeu
ajustes na regulação para garantir o atendimento no Hemocentro e disse que vai
articular com conselhos e universidades ações de formação continuada.
A doença falciforme é genética e hereditária, caracterizada pela alteração no formato das
hemácias, que passam da forma arredondada para estrutura semelhante a uma foice. As
manifestações surgem no primeiro ano de vida e podem afetar vários órgãos, provocando
crises de dor, anemia e infecções. O Ministério da Saúde estima que de 60 mil a 100 mil
pessoas convivam com a condição no país.


